Sobre as Medicinas

Tabaco

Tido como Pajé (rumê) por povos amazônicos, Pai Tabaco (Taita Sairi) por povos andinos, e por muitos outros nomes e formas, o tabaco é consagrado como uma poderosa medicina pela quase totalidade dos povos nativos que habitam ou já habitaram as Américas.

Esta é a medicina da comunicação, da expressão da nossa verdade (o que vai no coração). Sua erva, queimada no fornilho do cachimbo ou na palha, ao ser pitada, produz a fumaça que se eleva com nosso sopro, fortalecendo nossas intenções e pensamentos.

É assim o veículo para os nossos rezos ao Grande Espírito e para nos dirigirmos a todas as forças e espíritos da floresta, ou para a conexão com nosso sagrado Eu interior. Isto pode ser feito no silêncio dos nossos pensamentos ou na expressão da nossa palavra. Pode ser, assim, instrumento para o entendimento mútuo entre irmãos, sendo utilizado também em rodas cerimoniais de conversação e de troca.

Esta medicina é também da limpeza e da cura. Ao soprar sua fumaça, o curador afasta os maus espíritos do paciente e limpa o seu campo energético.

Importante instrumento utilizado junto ao tabaco é o cachimbo, também conhecido como chanupa (Lakota), xanduca (Fulni-ô), xandoré (Xukuru), petyngua(Guaranis), dentre muitos outros nomes... Este é o instrumento sagrado que "medita entre o ser humano e Deus", como disse uma vez um xamã Lakota. Ele representa, em muitos casos, a conexão dos princípios masculino (pito) e feminino (fornilho), sendo o recipiente que recebe e libera a força do tabaco junto com o fogo.

As ritualísticas para o uso do tabaco são as mais variadas. Normalmente, a fumaça é passada pelo corpo daquele que acende, seguido de momentos de silêncio, de canto ou de expressão da fala/rezo. O mais importante, a toda vez que o tabaco for acesso, é saber como andam os pensamentos e as intenções quando se chama pela companhia desta força. O tabaco é um poderoso potencializador destes elementos, sejam eles expressos de forma consciente ou não. Com isto, ele pode tanto libertar, quando aprisionar, a depender do que se passa na sua mente e coração no momento desta conexão!

Publicado em: https://www.instagram.com/p/COSgHe8Anzz/

Rapé

O rapé é uma medicina feita com ervas secas, cinzas de árvores ou sementes, que recebe o tabaco, o "pajé" dentre as plantas. Estes são pilados e moídos, peneirados e transformados em um único pó, bem fino.

Já no seu feitio, uma conexão sagrada é realizada, com a aliança do feitor com o fogo e os espíritos da medicina! Assim, esta é uma medicina preparada para o contato com as forças e os espíritos sagrados da floresta, através do espírito da própria medicina. Através deste contato, recebemos os ensinos destes espíritos junto com nosso Eu mais profundo, que guarda, em essência, toda a sabedoria do cosmos!

O rapé também é utilizado por pajés, xamãs e curadores desde há muito tempo como veículo para facilitar a cura daqueles que os procuram. Além de atuar diretamente em todos os corpos do paciente, ele amplia a visão e permite ao curador o acesso os campos de cura mais sutis. Curadores e rapé formam assim um único instrumento neste trabalho de cura!

Através desta medicina ampliamos nossas capacidades mediúnicas, alinhamos nossos pensamentos e emoções, e podemos receber a cura física, especialmente quando estamos receptivos e quando nos preparamos adequadamente para o seu uso!

A medicina deve ser sempre utilizada com muito respeito pela sua força e pelo seu propósito. Assim, deve ser consagrada junto com o silêncio interior de cada um, acompanhada dos rezos e, eventualmente, com as músicas sagradas que ajudam a evocar as forças que a acompanham.

Existem vários tipos de rapés e de sopros, que são utilizados conforme os propósitos desejados, como limpezas, conexão espiritual, com animais e plantas, trabalhos de cura, ampliação da consciência, etc.

O trabalho do rapé é sempre integrado à intenção, tanto de quem o sopra quanto de quem o recebe. Sua ação pode ser potencializada ou reduzida, conforme estas intenções que circulam!

O rapé é uma medicina de uso cotidiano. Entretanto, tome sempre cuidado quando o uso é frequente! O tabaco é uma poderosa planta, que tanto pode curar quanto aprisionar, devendo ser sempre utilizada com muito respeito!

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CN8HBtEgpHP

Ayahuasca

A Ayahuasca, Santo Daime, Hoasca, Vegetal, Uni, Yage e tantos outros nomes, é uma bebida feita da cocção de um cipó (mariri, jagube...) com uma folha (chacrona, rainha...), que é apurado durante horas sob o calor intenso do fogo!

Neste preparo, e na junção de todos os elementos, esta sagrada bebida vai incorporando todos os mistérios das plantas e da floresta, a serem liberados, juntos com seu espírito, no momento da sua ingestão!

A ayahuasca é um profundo alterador de consciência. Mas a alteração provocada não se dá de qualquer forma, levando a medicina a ser chamada de “professora.” Através da expansão da consciência, o chá permite que acessemos regiões dentro de nós que dificilmente chegamos de outra forma. Neste processo, chegamos a regiões de pura luz, como também de sombras, muitas vezes escondidas no profundo do nosso ser. Como diz o mestre Irineu quem toma esta bebida “não deve só procurar ver belezas e primores e sim corrigir seus defeitos”. É o que o a medicina nos mostra sempre.

Esta expansão permite a contemplação de nós mesmos, de quem nós somos, da nossa mente, das nossas emoções e do nosso próprio espírito. Pode nos dar espaço também para enxergarmos nosso lugar no universo, e o quanto somos parte do todo e o quanto o todo está dentro de nós. Muitas vezes são nestes momentos que ocorrem as chamadas “mirações”, que muitos que já se serviram desta bebida tiveram a oportunidade de experimentar!

Por causa disto, ela é uma medicina profundamente curadora. Esta expansão da consciência faz com que tragamos para superfície resoluções e percepções sobre nós mesmos que levam a alterações na nossa própria vida, especialmente nas relações com todos aqueles que nos cercam!

Mas cuidado, a “madrecita”, assim como é amorosa, pode ser também bastante dura conosco mesmos! Pela clareza que ela proporciona que nós nos enxerguemos, ela pode desferir pesados golpes no nosso próprio ego!

Por fim, recomendamos que a bebida seja sempre utilizada num contexto ritualístico, junto a grupos e pessoas que estejam trabalhando com respeito ao poderoso espírito desta medicina!

Publicado em: https://www.instagram.com/p/COkb3gkrQb4

Jurema

A medicina da Jurema é uma bebida feita a partir da infusão das cascas dos troncos e raízes da árvore da Jurema Preta. Tradicionalmente, o seu preparo leva alguns dias, indo desde a maceração, infusão, exposição à lua e descanso na terra.

A Jurema Preta é considerada uma protetora das matas do sertão, e de todos os seres que se conectam com sua força. Ela prospera em regiões semiáridas, em solos em que a maioria das plantas não conseguem "vingar" devido à aridez e à baixa fertilidade por serem pedregosos (tabuleiro). Ela é, assim, ecologiamente, uma precursora, fornecendo ambiente em que outras plantas e animais podem viver!

A partir da tradição dos povos indígenas do nordeste, o Chá da Jurema é consagrado nos rituais de toré. Junto com a sua dança, caracterizada pelo ritmo forte e pelas batidas dos pés no chão, e com a entoação dos cantos sagrados, a bebida leva a estados alterados de consciência que permitem o contato com as forças da natureza e com os "Encantados".

Dentro do sincretismo religioso do nordeste do Brasil, o uso desta medicina é também muito comum nos rituais do catimbó, que no contexto urbano têm se aproximado das práticas da umbanda. Neste contexto, a preparação da bebida sofre algumas alterações com relação a sua forma tradicional, conforme a linha de trabalho de cada casa.

Nos rituais com a Jurema Sagrada, um companheiro importante dos rezos é o tabaco, utilizado junto com o cachimbo. O papel do tabaco aqui é a limpeza espiritual e o trabalho conjunto com a força da Jurema, potencializando seus efeitos e ampliando os canais de comunicação com os encantados!

A Jurema é também uma medicina feminina, guerreira e cabocla, atuando diretamente no equilíbrio destas forças, especialmente na mulher, mas também em todos que dela se utilizam! É uma medicina fortemente conectada com a força da lua e com os mistérios da noite e das matas!

É também uma medicina da terra, do corpo físico, permitindo uma abertura espiritual ancorada nestas forças. Ao mesmo tempo que é uma planta curadora deste corpo, é também uma planta professora, que traz seus ensinos para nosso espírito. 

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CO2dZ3ihDhV

Kambô

O Kambô é retirado de um sapo com o mesmo nome. Como toda a medicina, o rezo e o preparo já começam muito antes do uso pelo próprio paciente. Dentro da floresta, busca-se o sapo com muita paciência, até que ele é encontrado, normalmente em copas de árvores, próximo à agua. Seu canto é o que mostra ao homem-medicina onde ele se encontra! Muito dócil, se deixa tomar facilmente, embora muitas vezes se requeira destreza para apanhá-lo devido ao local em que ele escolhe ficar, no alto e protegido das suas presas!

No rezo, com cuidado e firmeza, ele é amarrado, e retira-se o "leite" das suas glândulas, que então vai para uma paleta de madeira preparada previamente com esmero. Depois disto, e já cansado pelo trabalho feito, ele é devolvido para a natureza!

O kambô é então aplicado no paciente, em uma queimadura feita na pele, para que o veneno encontre mais fácil a corrente sanguínea. Esta queimadura é feita com o cipó "titica", que, segundo estudos, tem propriedades anti-inflamatórias.

É então que o trabalho da medicina começa no corpo de quem a toma. Os efeitos vão desde taquicardia, aumento da pressão e intensa náusea. Este é o sinal de que a limpeza e a cura estão ocorrendo no corpo! É uma medicina que se sente intensamente no corpo físico, mas que age também em todos os corpos sutis, especialmente no espírito!

É uma medicina que fortalece os sistemas de defesa do corpo, e pode ajudar a curar diversas doenças! Também serve para limpar a panema, e os indígenas a utilizam para caçar, já que nesta limpeza o guerreiro passa a atrair com mais facilidade sua caça, tendo espantado todas as energias que o desequilibram!

A medicina do kambô tem também os seus preceitos. É preciso que se beba muita água e que ela seja tomada em jejum. Como todas as outras, deve ser consagrada no rezo, já que ao se utilizar dela, é principalmente com seu espírito que tomamos contato!

Salve a força do kambô!

Haux haux!

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CPIjtduDL32

Yopo

O Yopo é uma medicina tradicionalmente utilizada por diversos povos da América Latina. É um tipo de rapé que é preparado a partir das sementes da árvore de grande porte de mesmo nome (ou Angico, como é mais popularmente conhecida no Brasil), que são torradas e moídas, sendo posteriormente agregados pós alcalinos (ostras ou cinzas) e o tabaco, podendo ter outras substâncias conforme o conhecimento do povo que o prepara.

Da mesma árvore se faz também o rapé de paricá, a partir das cinzas das cascas do seu tronco. Embora este rapé não tenhas as mesmas propriedades do yopo, também é um potente enteógeno que abre as portas para as comunicações com os reinos espirituais!

Na sua composição há uma quantidade de DMT, mesmo princípio ativo da Ayahuasca e da Jurema. Por isto sua ação é bastante intensa e profunda para aquele que desta medicina se utiliza. Através desta medicina, é possível ter mirações, visões e grandes ensinos provindos dos mistérios da floresta e de dentro de nós mesmos.

Sendo um rapé visionário, pajés e curandeiros o utilizavam (e utilizam) para se comunicar com seres espirituais, predizer o futuro e se conectar com a sabedoria da floresta!

É uma medicina de efeito muito rápido, como toda que é utilizada pelas vias aéreas. Logo no início, sente-se um grande desconforto físico, podendo haver limpezas através do vômito (ou de outras formas), para então se iniciar o processo visionário. Pela sua intensidade, provoca uma intensa ruptura com nosso ego e com nossos padrões de pensamento, levando à cura e ao acesso a estas visões espirituais!

Como a maior parte das medicinas, o yopo nos ensina de forma dura e incisiva a partir do confronto com o que nós temos no nosso interior! Assim, muitos relatam visões, contatos espirituais e processos de auto-conhecimento similares ao que ocorre com a ayahuasca, entretanto em um tempo mais curto, podendo o processo todo durar cerca de 1 hora. É um processo de catarse um tanto explosivo ocorrendo em nosso interior, em que vêm à superfície do consciente muito do que temos dentro de nós, o que leva à cura e à percepção de respostas sobre nós mesmos e nossa vida! 

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CPdZePNjXpO

Peiote

O Peiote é um pequeno cacto redondo, uma planta de poder que vem do deserto, utilizada pelos nativos do México e do sul dos EUA.

Depois de colhido, o cacto é deixado para secar, adquirindo então, o aspecto de um botão enrugado de cor marrom. Pode também ser preparado na forma de chá, quando passa por um processo de fervura. A planta contém cerca de 15 alcaloides de ações diversas, sendo o principal deles a mescalina. A ação conjunta destes alcaloides produz uma série de complexas manifestações fisiológicas, psíquicas, levando também a viagens espirituais!

Conta-se que sua origem remonta aos antigos astecas, sendo conhecido originalmente no idioma nauath por peiotl. Os huicholes (considerados grandes guardiões da medicina) o conhecem por “hicurí”; os coras, por “huatari”, os tarahumares também o designam também por “huanamê” que significa superior, mais alto. Os kiowas o denominam de “seni”, os comanches por “wokowi” e os apaches por “ho”.

Especialmente nos EUA o uso do peiote e as práticas ritualistas associadas são protegidos pela Igreja Nativa Americana – NAC (Native American Church), instituição criada pelos nativos para o seu livre exercício religioso. A história destes povos é também fortemente marcada por perseguição e opressão em todos os aspectos, inclusive religioso. Líderes destas tradições dizem que só foi possível uma prática religiosa mais livre, nos EUA, a partir dos anos 90. Mesmo assim, o peiote é hoje uma planta proibida na maioria dos países do mundo, inclusive no Brasil.

Tradicionalmente, o peiote é uma medicina cerimonial, e seu uso é realizado com o acompanhamento da sonaja (maracá), e do rufar dos tambores de água, com os cantos, rezos e contação de histórias, Assim como muitas medicinas e plantas de poder, a cerimônia adequada ativa todo o seu potencial e ajuda a conduzir a jornada em direção à cura, à comunicação miraculosa com o mundo invisível e às profundas visões espirituais! Estas cerimônias são momentos de partilha e aprendizado em comunidade, e de agradecimentos e conexão com o Criador!

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CP_f2GwDNhM

Wachuma - São Pedro

A wachuma, também conhecida por São Pedro, huachuma, achuma, agua colla, cardo, huando hermoso, gigantón, San Pedrito, San Pedrillo é um cacto de crescimento rápido originário dos Andes. Chega a uma altura de 3 a 6 metros, e a um diâmetro de 10 cm, com várias ramificações desde sua base, com 4 a 7 nervuras, sendo quase ausente de espinhos.

Wachuma significa, em Quíchua, "ébrio e consciente". O nome São Pedro tem origem no catolicismo, em alusão ao seu poder de “abrir as portas do céu”. Seu uso remete a mais de 3000 anos, especialmente nas regiões andinas, entretanto considera-se que muito das suas práticas tradicionais já se perderam por causa do sincretismo religioso.

Assim como o peiote, a wachuma é rica em vários tipos de alcaloides, sendo o principal a mescalina. Ministrado em dose mínima não produz nada na percepção sensitiva, mas induz a um efeito sedante e em doses mais elevadas pode levar a um sono profundo e até a alguns distúrbios neurológicos.

Segundo os xamãs peruanos, o San Pedro tem uma entidade mítica, um espírito, que permite a visão e a instrução do xamã durante o transe! As formas de suas manifestações espirituais dependem da cultura de quem o experimenta. Frequentemente são manifestações antropomórficas ou de animais, sendo neste caso muito comum a presença do jaguar!

A manifestação do espírito é o caminho para o êxito das cerimônias terapêuticas e/ou adivinhatórias e permite o xamã conhecer a origem sobrenatural das doenças e dos feitiços, bem como o responsável pela ação material ou mágica que fez o dano ao paciente, permitindo ainda ver as plantas que irão curar o enfermo.

Assim, por meio do San Pedro o xamã passa por uma “puerta” entre o mundo visível e invisível, geralmente guardada pelo Puma. Obtêm o contato com as almas das coisas, dos seres, e lugares para estabelecer uma relação com elas. O San Pedro permite a entrada no mundo dos “encantados”, ou seja, das entidades míticas do universo andino. Ainda por meio da “virtude” do San Pedro o xamã ultrapassa os limites das dimensões espaço-tempo relacionado com o estado de consciência sensorial e adquire capacidades adivinhatórias. 

Publicado em: https://www.instagram.com/p/CQTInNNDDRg